Vereadores de Itaúna vão responder por enriquecimento ilícito se não for revogado aumento salarial do prefeito, vice-prefeita, vereadores e agentes políticos
Se a população não conseguiu evitar que a Câmara aprovasse o reajuste de salário para o prefeito Neider Moreira, a vice-prefeita Gláucia Santiago, secretários municipais e os próprios vereadores, o Ministério Público está fazendo.
O aumento, que os beneficiados chamaram de “recomposição salarial” é proibido no primeiro ano de um mandato, mas isto não inibiu prefeito e vereadores que decidiram mudar a lei para que o projeto fosse aprovado, em plena pandemia quando há milhares de desempregados em Itaúna e, consequentemente, muita gente passando por dificuldades até de alimentação.
O projeto foi aprovado no dia 9 de março com apenas os vereadores Márcia Cristina e Kaio Guimarães votando abertamente contra, permitindo “recomposição salarial” de 12% para prefeito, vice-prefeita, vereadores e secretários.
A aprovação do aumento acabou levando o Ministério Público a investigar indícios de irregularidades nos Projeto de Lei, Projeto de Resolução e Projeto de Emenda à Lei Orgânica municipal.
Para o Ministério Público o salário dos vereadores só sofrerá reajuste a cada ano trabalhado.
Assim o MP enviou ao Legislativo itaunense a “Recomendação” de nº 1/2021, “Procedimento Preparatório nº MPMG-0338.21.000098-4”, onde recomenda ao presidente da Câmara, Alexandre Magno Debique Campos que revogue o aumento salarial para prefeito, vice-prefeita, vereadores e agentes políticos em 12%, sob pena de responderem em Ação Civil Pública por “prática de ato de improbidade administrativa” e “enriquecimento ilícito”.
A Câmara tem prazo de 10 dias corridos para que sejam adotadas providências em face da Recomendação.
Confira a Recomendação do Ministério Público na íntegra:
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS
1ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE ITAÚNA
RECOMENDAÇÃO nº 1/2021
(Procedimento Preparatório nº MPMG-0338.21.000098-4)
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS, por intermédio da 1ª Promotoria de Justiça da Comarca de Itaúna, em atuação na Curadoria do Patrimônio Público, nos termos do art. 129, III e VI, da Constituição da República, art. 26 da Lei nº 8.625/93 e artigo 67 da Lei Complementar nº 34/94;
CONSIDERANDO que é atribuição do Ministério Público a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, nos termos do art. 127 da Constituição da República e do art. 119 da Constituição do Estado de Minas Gerais;
CONSIDERANDO que a Constituição da República e a Constituição do Estado de Minas Gerais preconizam como função institucional do Ministério Público a defesa dos interesses difusos e coletivos, dentre eles a proteção do Patrimônio Público (Constituição da República, art. 129, incisos III, e art. 120, inciso III, da Constituição do Estado de Minas Gerais);
CONSIDERANDO que o art. 37, caput, da Constituição da República, dispõe que: “a administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade e da eficiência”;
CONSIDERANDO que o princípio da supremacia do interesse público impõe ao administrador público atuação com foco primário no interesse público e na supremacia do interesse da coletividade sobre o interesse do particular, evitando-se a persecução de interesses privados e favoritismos, e, portanto, o desvio de finalidade;
CONSIDERANDO que o MINISTÉRIO PÚBLICO instaurou o Procedimento Preparatório nº MPMG 0338.20.000098-4 com a finalidade de apurar a ilegalidade e a inconstitucionalidade de projeto de lei1, projeto de resolução e projeto de emenda à Lei
Orgânica municipal que, em conjunto, visaram a aprovação do reajuste/aumento de subsídios dos agentes políticos municipais, em desacordo com o disposto na CR/88, na Constituição do Estado de Minas Gerais e na Lei Complementar nº 173/2020, no bojo do qual se comprovou a inconstitucionalidade e a ilegalidade referidas;
CONSIDERANDO que, a Câmara Municipal de Itaúna, por meio da Resolução nº 4, de 9 de março de 2021 (projeto de Resolução nº 7, de 22/2/2021), aprovou a fixação, com reajuste/aumento, dos subsídios dos vereadores para o ano de 2021, nos seguintes termos:
Art. 1º. Fica concedida recomposição inflacionária de 5,45% (cinco inteiros e quarenta e cinco centésimos por cento) referentes ao INPC (Índice Nacional de Preço ao Consumidor) acumulado no período de janeiro a dezembro 2020, mais 6,58 (seis inteiros e cinquenta e oito centésimos por cento) referentes ao INPC acumulado referente à competência 2017, calculados sobre o período de janeiro a dezembro de 2016, sobre os subsídios dos vereadores desta Câmara Municipal de Itaúna-MG.
Art. 2º. As recomposições de que trata esta Resolução serão calculadas sobre os valores devidos com aplicação a partir de 1º de janeiro de 2021.
CONSIDERANDO que, após análise da resolução supracitada, constatou-se inúmeras inconstitucionalidades e ilegalidades, conforme a seguir detalhado;
CONSIDERANDO que a Resolução nº 4/2021 foi aprovada e promulgada em 9/3/2021, portanto, após as eleições municipais ocorridas em Novembro/2020, e durante a legislatura dos candidatos eleitos, em afronta ao princípio da anterioridade, previsto no inciso VI do art. 29 da CR/88, no artigo 179 da Constituição do Estado de Minas Gerais2 e no art. 59 da Lei Orgânica Municipal de Itaúna;
CONSIDERANDO que, no art. 29, inciso VI, da CR/88, está expresso que a fixação dos subsídios dos vereadores deve ser feita para vigorar “em cada legislatura para a subsequente” (Grifou-se);
CONSIDERANDO, ainda, que a fixação de subsídios pelos próprios agentes políticos eleitos, na legislatura vigente, fere os princípios da Administração Pública, especialmente o da moralidade, previstos no art. 37, caput, da Constituição da República, e nos artigos 13 e 166, VI, da Constituição Estadual3:
CONSIDERANDO que a interpretação dada pelo Supremo Tribunal Federal à ordem constitucional é no sentido de não autorizar nem mesmo a revisão geral anual dos subsídios dos agentes políticos eletivos, sem a observância do princípio da anterioridade, por força do disposto no inciso V do artigo 29 da Constituição da República, com a redação que lhe foi dada pela EC nº 1/1992, assim como, no inciso VI do mesmo dispositivo, com a redação que lhe foi dada pela EC nº 25/2000, ainda, na esteira do que prevê o art. 179 da Constituição do Estado de Minas Gerais;
Decisão: Trata-se de recurso extraordinário interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo assim ementado: “AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE — Pretensão que envolve as Leis n° 1.943/2012, n° 1.944/2012, n° 2.024/2014, n° 2.025/2014, n° 2.047/2015, n° 2.051/2015, n° 2.070/2016 e a n° 2.071/2016, todas do município de Barbosa —Estabelecimento de revisão anual na remuneração do Prefeito, do Vice-prefeito e dos vereadores — Possibilidade de reajuste ao Chefe e ao Vice do Poder Executivo, como agentes políticos, porquanto não há vedação nos textos constitucionais, conforme arts. 37, X, 39, § 4°, da CF e art. 115, XI, da CE —Incompatibilidade da mesma medida aos Vereadores, também agentes políticos, pois devem seguir a regra da legislatura, estabelecida no art. 29, VI, da Constituição Federal, que deve ser seguida também em âmbito estadual e municipal pelo princípio da simetria e pelo teor do art. 144 da Constituição do Estado de São Paulo — Precedentes deste C. Órgão Especial — Regime jurídico dos subsídios que não se confunde com o de vencimentos dos servidores públicos em geral — Ação parcialmente procedente”. (eDOC 13, p. 13) No recurso extraordinário, interposto com fundamento no art. 102, III, “a”, da Constituição Federal, aponta-se violação aos arts. 29, V e VI; 37, caput, X; e 39, § 4º, do texto constitucional. (eDOC 13, p. 55) Alega-se, em síntese, que “a alteração dos subsídios durante a legislatura é incompatível com os princípios de moralidade e impessoalidade, constantes da cabeça do art. 37 da Constituição da República, na medida em que sua operacionalização nesse período oportuniza a concessão de benesse indevida (a majoração do subsídio) em detrimento do prestígio às ‘regras do jogo’ previamente definidas, consistentes na fixação precedente do subsídio do Chefe do Poder Executivo à sua investidura no cargo, abrindo oportunidades ao estabelecimento de informais ‘moedas de troca’ no sensível domínio da interdependência dos Poderes“. (eDOC 13, p. 67). Assim, o acórdão recorrido teria contrariado o disposto na Constituição Federal, ao concluir pela possibilidade de revisão de subsídios do Prefeito e do Vice-Prefeito durante a legislatura. Pugna-se, ao final, pelo provimento do recurso extraordinário para que seja reformado o acórdão recorrido e julgada totalmente procedente a ação direta de inconstitucionalidade contra as Leis 2.024/2014; 2.051/2015; 2.070/2016 do Município de Barbosa. Em 13 de dezembro de 2017, dei provimento ao recurso extraordinário para cassar o acórdão recorrido e determinar que outro fosse proferido de acordo com a jurisprudência desta Corte. Retornando os autos ao Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, este manteve o mesmo entendimento anteriormente exarado. Contra esse novo acórdão foi interposto o presente recurso extraordinário. Decido. Assiste razão ao recorrente. Esta Corte firmou entendimento no sentido de que a remuneração de Prefeito, Vice-Prefeito e de Vereadores será fixada pela Câmara Municipal, para a legislatura subsequente, de acordo com o disposto no art. 29, VI, da Constituição Federal. Confiram-se, a propósito, os seguintes julgados de ambas as Turmas desta Suprema Corte: “DIREITO CONSTITUCIONAL. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. VEREADORES. FIXAÇÃO DE SUBSÍDIOS. COMPETÊNCIA DA CÂMARA MUNICIPAL. INCONSTITUCIONALIDADE DE LEI MUNICIPAL EM FACE DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL. OFENSA AO ART. 29, VI, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL: INEXISTÊNCIA. 1. A norma municipal foi declarada inconstitucional pelo órgão especial do TJ/SP, por violação aos arts. 144 da Constituição do Estado de São Paulo. 2. A fixação dos subsídios de vereadores é de competência exclusiva da Câmara Municipal, a qual deve respeitar as prescrições estabelecidas na Lei Orgânica Municipal, na Constituição do respectivo Estado, bem como na Constituição Federal. 3. Permaneceu inatacado, nas razões recursais, fundamento suficiente para a manutenção do acórdão recorrido. 4. Agravo regimental a que se nega provimento”. (RE-AgR 494.253, Rel. Min. Ellen Gracie, Segunda Turma, DJe 15.3.2011) “DIREITO CONSTITUCIONAL. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. REQUISITOS PARA AJUIZAMENTO DE AÇÃO POPULAR.
LEIS QUE CONCEDERAM REAJUSTE DE AGENTES POLÍTICOS NO CURSO DA MESMA LEGISLATURA. IMPOSSIBILIDADE. 1. A jurisprudência desta Corte se orienta no sentido de que a própria ilegalidade do ato praticado configura lesividade ao erário, sendo legítima a interposição da ação popular. Precedentes. 2. O Supremo Tribunal Federal assentou que o art. 29, V, da Constituição Federal é autoaplicável, devendo o subsídio dos agentes políticos ser fixado até o final de uma legislatura para produzirem efeitos na seguinte. Precedentes. 3. Para dissentir da conclusão firmada pelo Tribunal de origem, no sentido de que o Decreto Legislativo nº 156/1996 e a Resolução nº 157/1996 implicaram reajuste da remuneração dos agravantes e produziram efeitos na mesma legislatura, seria imprescindível a análise das normas locais acima mencionadas, bem como o reexame dos fatos e do material probatório constantes dos autos, providências vedadas neste momento processual (Súmulas 279 e 280/STF). 4. Ausência de argumentos capazes de infirmar a decisão agravada. 5. Agravo regimental a que se nega provimento”. (AI-AgR 745.203, Rel. Min. Roberto Barroso, Primeira Turma, DJe 6.8.2015) “Prefeito. Subsídio. Art. 29, V, da Constituição Federal. Precedente da Suprema Corte. 1. Já assentou a Suprema Corte que a norma do art. 29, V, da Constituição Federal é auto-aplicável. 2. O subsídio do prefeito é fixado pela Câmara Municipal até o final da legislatura para vigorar na subseqüente. 3. Recurso extraordinário desprovido”. (RE-AgR 204.889, Rel. Min. Menezes Direito, Primeira Turma, DJe 16.5.2008) Assim, o acórdão recorrido, ao afirmar que não se aplica à fixação do subsídio do Prefeito e do Vice-Prefeito o preceito temporal da legislatura, destoa do entendimento firmado por esta Corte sobre a questão. Ante o exposto, dou provimento ao recurso extraordinário para reformar o acórdão recorrido, assentando a procedência do pedido formulado na ação direta de inconstitucionalidade, nos termos da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (arts. 21, §1º, do RISTF). Publique-se. Brasília, 7 de agosto de 2019. Ministro Gilmar Mendes Relator Documento assinado digitalmente. (RE 1064365, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, julgado em 07/08/2019, publicado em PROCESSO ELETRÔNICO DJe-176 DIVULG 13/08/2019 PUBLIC 14/08/2019).
Decisão Trata-se de Agravos contra decisões que inadmitiram Recursos Extraordinários interpostos em face de acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Na origem, trata-se de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público em face da Câmara Municipal de Tupã e de seus vereadores objetivando a declaração incidental de inconstitucionalidade das Leis Municipais 74/2005, 98/2006, 120/2007 e 134/2008, ao argumento de que teriam concedido aos agentes políticos do poder legislativo municipal revisão geral anual, previsto constitucionalmente aos demais servidores públicos, e sem respeito à regra da anterioridade, postulando, ainda, a condenação dos réus à devolução dos valores indevidamente recebidos. A sentença julgou procedente o pedido e declarou inconstitucionais, pela via incidental, as normas impugnadas “que concederam a revisão geral anual dos subsídios dos Vereadores componentes da legislatura vigente à época da sanção de tais leis”, bem como condenou os réus à devolução ao erário dos valores recebidos a esse título” (fl. 183, Vol. 3). O Tribunal de origem manteve a sentença que julgou procedente o pedido em acórdão assim ementado (fl. 153, Vol. 4): “AÇÃO CIVIL PÚBLICA. Controle da Concessão de revisão geral anual aos vereadores da Câmara Municipal de Tupã na mesma legislatura. Pretensão de declaração de inconstitucionalidade incidental das Leis Municipais n°s 74/2005, 98/2006, 120/2007 e 134/2008, por violação ao art. 29, inciso VI, da Constituição Federal. Reconhecimento de inconstitucionalidade incidental das leis pelo Órgão Especial deste Eg. Tribunal, com efeitos “ex tunc”. Decisão que vincula este julgamento. Proibição da vinculação do reajuste dos subsídios dos vereadores à revisão geral anual do funcionalismo público municipal, sob pena de violação ao art. 29, VI, da CF. Observância da “regra da legislatura”. Sentença de procedência mantida. Recursos improvidos.” Opostos Embargos de Declaração, foram rejeitados (fl. 202, Vol. 4). No Recurso Extraordinário interposto por ANTÔNIO ALVES DE SOUSA e outros (fls. 4-28, Vol. 6), alega-se, com fundamento no art. 102, III, “a” da Constituição Federal, violação aos seguintes dispositivos constitucionais: (a) arts. 29, V e VI; 37, X; e 39, § 4°, pois (a1) o acórdão recorrido “negou a possibilidade de revisão geral anual aos agentes políticos” (fl. 10, Vol. 6); (a2) a regra da anterioridade não impede a correção da perda inflacionária que se perfaz por meio da revisão geral anual; e (a3) as lei municipais declarada inconstitucionais “não fixaram e nem majoraram os subsídios dos vereadores, mas tão somente aplicaram correção inflacionária” (fl. 22, Vol. 6), sendo, portanto, necessário o reconhecimento da constitucionalidade das Leis Municipais 74/2005, 98/2006, 120/2007 e 134/2008; (b) art. 93, IX, caso se entenda que não houve o prequestionamento da matéria. Quanto ao Recurso Extraordinário apresentado por AUGUSTO FRESNEDA TORRES e outro (fls. 37-56, Vol. 6), alega-se, com fundamento no art. 102, III, “a” da Constituição Federal, violação aos arts. 29, V e VI; 29-A; 37, X e XI; 39, § 40; e 93, IX, da Carta Magna, pois: (a) “a revisão geral anual é obrigatória e constitui direito subjetivo dos servidores públicos e dos agentes políticos, sendo um instrumento que visa, unicamente, rever o valor aquisitivo, ou seja, o valor nominal da remuneração ou subsídio em face da desvalorização da moeda, ocasionada pela inflação” (fl. 48, Vol. 6); (b) a norma expressa no artigo 37, inciso X da Constituição Federal, é extensiva aos vereadores, como membros do Poder Legislativo e agentes políticos que são, assegurando-se a revisão geral anual de seus subsídios; (c) em se tratando de revisão geral anual, é inaplicável a regra da legislatura; (d) agiram de boa-fé, já que a revisão de seus subsídios é uma garantia constitucional, razão pela qual não há falar em devolução dos valores recebidos; e (e) no caso, houve negativa de prestação jurisdicional, uma vez que o acórdão recorrido não encontra-se devidamente fundamentado. O Tribunal de origem negou seguimento aos Recursos Extraordinários aplicando os óbices previstos nas Súmulas 280/STF e 636/STF (fls. 165-166 e 167-168, Vol. 6). Em sede de Agravos em Recursos Extraordinários os agravantes refutaram todos os óbices apontados pelo juízo de admissibilidade (fl. 178, Vol. 6; e fl. 4, Vol. 7). É o relatório. Decido. Tendo em vista a identidade da matéria e a similitude das alegações apresentadas em ambos os recursos, passo a analisá-los conjuntamente. Os recursos extraordinários somente serão conhecidos e julgados, quando essenciais e relevantes as questões constitucionais a serem analisadas, sendo imprescindível ao recorrente, em sua petição de interposição de recurso, a apresentação formal e motivada da repercussão geral que demonstre, perante o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, a existência de acentuado interesse geral na solução das questões constitucionais discutidas no processo, que transcenda a defesa puramente de interesses subjetivos e particulares. A obrigação dos recorrentes de apresentarem formal e motivadamente a preliminar de repercussão geral que demonstre, sob o ponto de vista econômico, político, social ou jurídico, a relevância da questão constitucional debatida que ultrapasse os interesses subjetivos da causa, conforme exigência constitucional, legal e regimental (art. 102, § 3º, da CF/88, c/c art. 1.035, § 2º, do Código de Processo Civil de 2015), não se confunde com meras invocações, desacompanhadas de sólidos fundamentos e de demonstração dos requisitos no caso concreto, de que (a) o tema controvertido é portador de ampla repercussão e de suma importância para o cenário econômico, político, social ou jurídico; (b) a matéria não interessa única e simplesmente às partes envolvidas na lide; ou, ainda, de que (c) a jurisprudência do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL é incontroversa no tocante à causa debatida, entre outras alegações de igual patamar argumentativo (ARE 691.595-AgR, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, DJe de 25/2/2013; ARE 696.347-AgR-segundo, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, Segunda Turma, DJe de 14/2/2013; ARE 696.263- AgR, Rel. Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, DJe de 19/2/2013; AI 717.821-AgR, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA, Segunda Turma, DJe de 13/8/2012). Não havendo demonstração fundamentada da presença de repercussão geral, incabível o seguimento dos Recursos Extraordinários. Em relação à suscitada ofensa ao art. 93, IX, da Carta Magna, o Juízo de origem não destoou do entendimento firmado por esta CORTE no julgamento do AI 791.292-QO-RG/PE (Rel. Min. GILMAR MENDES, Tema 339). Nessa oportunidade, o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL assentou que o inciso IX do art. 93 da Constituição Federal de 1988 “exige que o acórdão ou decisão sejam fundamentados, ainda que sucintamente, sem determinar, contudo, o exame pormenorizado de cada uma das alegações ou provas, nem que sejam corretos os fundamentos da decisão”. No caso em apreço, a fundamentação do acórdão recorrido alinha-se às diretrizes desse precedente. Além disso, a decisão recorrida não divergiu da jurisprudência do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL no sentido de que é vedada a vinculação dos subsídios dos agentes políticos ao reajuste da remuneração dos servidores públicos. Nesse sentido: “CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 4º DA LEI Nº 11.894, DE 14 DE FEVEREIRO DE 2003. – A Lei Maior impôs tratamento jurídico diferenciado entre a classe dos servidores públicos em geral e o membro de Poder, o detentor de mandato eletivo, os Ministros de Estado e os Secretários Estaduais e Municipais. Estes agentes públicos, que se situam no topo da estrutura funcional de cada poder orgânico da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, são remunerados exclusivamente por subsídios, cuja fixação ou alteração é matéria reservada à lei específica, observada, em cada caso, a respectiva iniciativa (incisos X e XI do art. 37 da CF/88). – O dispositivo legal impugnado, ao vincular a alteração dos subsídios do Governador, do Vice-Governador e dos Secretários de Estado às propostas de refixação dos vencimentos dos servidores públicos em geral ofendeu o inciso XIII do art. 37 e o inciso VIII do art. 49 da Constituição Federal de 1988. Sobremais, desconsiderou que todos os dispositivos constitucionais versantes do tema do reajuste estipendiário dos agentes públicos são manifestação do magno princípio da Separação de Poderes. Ação direta de inconstitucionalidade procedente.” (ADI 3.491, Rel. Min. AYRES BRITTO, Tribunal Pleno, DJ de 23/3/2007) De outro lado, o Tribunal de origem manteve a sentença de procedência do pedido ante os seguintes fundamentos, dentre outros (fls. 157-159, Vol. 4): “De fato, é incontroverso que as leis impugnadas concederam revisão geral anual de vencidos aos agentes políticos do Legislativo do Município de Tupã, sem observar as regras constitucionais quanto à fixação do subsidio com anteriormente, com efeitos apenas para a legislativa subsequente. Note-se que as leis municipais determinam inclusive que as revisões produzem efeitos retroativos (artigos 3 0 s), em total afronta às normas constitucionais. 2. Note-se que a Constituição Federal expressamente determina a forma de fixação dos subsídios dos vereadores, estabelecendo regras da anterioridade da legislatura para a sua fixação e a inalterabilidade do subsidio na mesma legislatura. […] Verifica-se, portanto, que a denominada “regra da legislatura” impede seja aplicada aos vereadores a norma disposta no artigo 37, X, da CF, porquanto em relação aos agentes políticos municipais não há falar em revisão anual nem em adoção de índice único correspondente ao aplicado para o funcionalismo. A alegação dos apelantes de estender a revisão geral anual – aos seus subsídios com finalidade de reposição de índices inflacionários, viola o artigo 29, inciso VI, da Constituição Federal, qual seja a regra da legislatura. Logo, evidentemente inconstitucional a extensão aos vereadores da revisão geral anual constante nas leis municipais questionadas,
o que impede sua aplicação nesta parte. 3. Neste sentido, houve o reconhecimento da inconstitucionalidade das citadas Leis Municipais nos 74/2005, 98/2006 1 120/2007 e 134/2008 pelo Órgão Especial, com efeitos “ex tunc”, justamente pela violação aos arts. 29, inciso VI e 37, inciso X, da Constituição Federal, além dos arts. 111 e 144 da Constituição Estadual, como se verifica pelos acórdãos de fls. 892/916 e 937/939. Assim, reconhecida no incidente próprio a inconstitucionalidade das leis nesta questão, com efeitos “ex tunc”, de rigor a declaração de nulidade dos pagamentos efetivos sob tal rubrica aos réus, bem como a condenação à devolução ao erário de tais valores na forma estabelecida na r. sentença (cf. fls. 623/624).” A respeito da matéria, verifica-se que a jurisprudência do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL é firme no sentido de ser necessária a observância da regra da anterioridade da legislatura na concessão de reajuste a agentes políticos. Neste sentido, citem-se os seguintes precedentes de ambas Turmas desta CORTE: “DIREITO CONSTITUCIONAL. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. REQUISITOS PARA AJUIZAMENTO DE AÇÃO POPULAR. LEIS QUE CONCEDERAM REAJUSTE DE AGENTES POLÍTICOS NO CURSO DA MESMA LEGISLATURA. IMPOSSIBILIDADE. 1. A jurisprudência desta Corte se orienta no sentido de que a própria ilegalidade do ato praticado configura lesividade ao erário, sendo legítima a interposição da ação popular. Precedentes. 2. O Supremo Tribunal Federal assentou que o art. 29, V, da Constituição Federal é autoaplicável, devendo o subsídio dos agentes políticos ser fixado até o final de uma legislatura para produzirem efeitos na seguinte. Precedentes. 3. Para dissentir da conclusão firmada pelo Tribunal de origem, no sentido de que o Decreto Legislativo nº 156/1996 e a Resolução nº 157/1996 implicaram reajuste da remuneração dos agravantes e produziram efeitos na mesma legislatura, seria imprescindível a análise das normas locais acima mencionadas, bem como o reexame dos fatos e do material probatório constantes dos autos, providências vedadas neste momento processual (Súmulas 279 e 280/STF). 4. Ausência de argumentos capazes de infirmar a decisão agravada. 5. Agravo regimental a que se nega provimento.” (AI 745.203-AgR, Rel. Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, DJe de 06/8/2015) “CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. VEREADORES. SUBSÍDIO. AUMENTO, DE FORMA RETROATIVA. IMPOSSIBILIDADE. VIOLAÇÃO AO ART. 29, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PRECEDENTES. 1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal consolidou entendimento no sentido de que a remuneração de Prefeito, de Vice- Prefeito e de Vereadores será fixada pela Câmara Municipal para a legislatura subsequente, em conformidade com o art. 29, V, da Constituição Federal. 2. Caso em que inobservado o art. 29, V, da Carta Magna, pois os vereadores majoraram, de forma retroativa, sua remuneração. 3. Agravo regimental desprovido.” (RE 458.413-AgR, Rel. Min. TEORI ZAVASCKI, Segunda Turma, DJe de 22/8/2013) O acórdão recorrido não divergiu desse entendimento, devendo, portanto, ser mantido. Diante do exposto, com base no art. 21, § 1º, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, NEGO SEGUIMENTO A AMBOS OS AGRAVOS. Não se aplica o art. 85, § 11, do Código de Processo Civil de 2015, tendo em vista que não houve fixação de honorários advocatícios nas instâncias de origem. Publique-se. Brasília, 16 de maio de 2019. Ministro Alexandre de Moraes Relator Documento assinado digitalmente. (ARE 1205333, Relator(a): Min. ALEXANDRE DE MORAES, julgado em 16/05/2019, publicado em PROCESSO ELETRÔNICO DJe-109 DIVULG 23/05/2019 PUBLIC 24/05/2019).
CONSIDERANDO que a Resolução nº 4/2021 concedeu o reajuste aos vereadores, nos termos seguintes, embasando-se, ainda, de forma imoral, ilegal e
ao INPC (Índice Nacional de Preço ao Consumidor) acumulado no período de janeiro a dezembro 2020, mais 6,58 (seis inteiros e cinquenta e oito centésimos por cento) referentes ao INPC acumulado referente à competência 2017, calculados sobre o período de janeiro a dezembro de 2016, sobre os subsídios dos vereadores desta Câmara Municipal de Itaúna-MG.
CONSIDERANDO que a Lei Complementar nº 173, de 27 de maio de 2020, que estabelece o Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus SARS-CoV-2 (COVID-19) expressamente vedou, em seu artigo 8º, a concessão de reajuste, aumento ou adequação de remuneração aos membros de poder, incluindo os parlamentares municipais4;
CONSIDERANDO que o reajuste do subsídio dos vereadores da Câmara Municipal de Itaúna, promovido nos termos da Resolução nº 4/2021, consiste em verdadeira burla à lei complementar supracitada, pois fica clarividente que a referida resolução se trata de aumento/reajuste (vedado), apenas o nomeando de “recomposição inflacionária”, e que somente não foi encaminhada no exercício anterior, nos termos do art. 179 da CEMG, diante da notória vedação da Lei Complementar nº 173/2020;
CONSIDERANDO que a aprovação do reajuste remuneratório pelos vereadores da Câmara Municipal de Itaúna, promovido nos termos da Resolução nº 4/2021, por se tratar de lei de efeitos concretos, pode importar em prática de ato de improbidade administrativa e ensejar a propositura de AÇÃO CIVIL PÚBLICA PELA PRÁTICA DE ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA, em razão da flagrante ilegalidade e inconstitucionalidade, configurando expressa violação de princípios da administração pública, prejuízo ao erário municipal e, consequente, enriquecimento ilícito, na esteira da jurisprudência do TJMG;
EMENTA: APELAÇÕES CÍVEIS – AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – LEI Nº. 1.487/2000 DO MUNICÍPIO DE JOÃO MONLEVADE – FIXAÇÃO DO SUBSÍDIO DOS VEREADORES E DO PRESIDENTE DA CÃMARA MUNICIPAL DE JOÃO MONLEVADE PARA A LEGISLATURA DE 2001 A 2004 – VIOLAÇÃO AO DISPOSTO NO ARTIGO 29, VI, “C”, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, COM A NOVA REDAÇÃO DADA PELA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº. 25/2000 – DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE PELO ÓRGÃO ESPECIAL DESTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA – RECURSOS DESPROVIDOS. – Conforme decidido pelo Órgão Especial deste Tribunal no julgamento do incidente de inconstitucionalidade suscitado nos presentes autos, o artigo 1º. da Lei nº. 1.487/2000, do Município de João Monlevade, não observou o disposto no artigo 29, VI, “c”, da Constituição Federal, com a nova redação dada pela Emenda Constitucional nº. 25/2000, desrespeitando o limite máximo para fixação do subsidio dos Vereadores de um Município com cinquenta e um mil a cem mil habitantes, que é de 40% (quarenta por cento) do subsídio dos Deputados Estaduais. – Dessa forma, há de se reconhecer como indevida a verba percebida pelos réus, configurando o ato de improbidade administrativa por lesão ao erário, pelo locupletamento ilícito dos apelantes e pela transgressão aos princípios da administração pública. (TJMG – Apelação Cível 1.0362.10.003828-4/001, Relator(a): Des.(a) Hilda Teixeira da Costa , 2ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 03/12/2014, publicação da súmula em 12/12/2014). (Grifou-se)
CONSIDERANDO, também, as ilegalidades e as inconstitucionalidades verificadas no processo legislativo que originaram o conjunto de leis em análise, conforme a seguir detalhado;
CONSIDERANDO que a fixação dos subsídios dos vereadores foi precedida de necessária alteração da Lei Orgânica Municipal, por meio da Emenda à Lei Orgânica nº 2/2021, aprovada em sessão legislativa única, do dia 22/2/2021;
CONSIDERANDO que o processo legislativo do projeto de Emenda à Lei Orgânica aprovado sob o nº 2/2021 não observou os requisitos previstos no art. 66, § 1º, da Lei Orgânica Municipal, remissivos ao art. 29, caput, da Constituição da República, excetuando a necessária votação em dois turnos, com interstício mínimo de 10 (dez) dias, no disposto no art. 110 do Regimento Interno daquela Casa, visivelmente inconstitucional;
CONSIDERANDO, ainda, que a Emenda à Lei Orgânica nº 2/2021 aprovada na reunião de 9/3/2021 promoveu a inserção de exceção no §2º do art. 37 da Lei Orgânica Municipal, dispositivo de flagrante inconstitucionalidade, por ofensa à aplicação do princípio da anterioridade previsto na CR/88 e na Constituição do Estado de Minas Gerais, a fim de autorizar a fixação de subsídios dos agentes políticos para a própria legislatura;
CONSIDERANDO que a alteração promovida na Lei Orgânica do Município de Itaúna, por meio da Emenda à Lei Orgânica nº 2/2021, violou os princípios da moralidade, visto que sua finalidade foi criar um cenário supostamente legal para a fixação dos subsídios dos agentes políticos do Município de Itaúna, com a finalidade exclusiva de atender aos interesses pessoais dos atuais agentes políticos;
CONSIDERANDO que o próprio Poder Legislativo, idealizador das normas impugnadas, no exercício de autocontrole da constitucionalidade, tem poderes para rever a Resolução nº 4/2021 e a Emenda à Lei Orgânica nº 2/2021;
RECOMENDA-SE ao Exmº. Sr. Presidente da Câmara Municipal de Itaúna, ALEXANDRE MAGNO MARTIONE DEBIQUE CAMPOS, e a TODOS os vereadores do Poder Legislativo de Itaúna, adotar as medidas tendentes à revogação da Resolução nº 4/2021 (projeto de Resolução nº 7) e da Emenda à Lei Orgânica nº 2/2021, em razão da violação dos incisos V e VI, do art. 29, e ao art. 37, caput, da Constituição da República de 1988, e aos artigos 13, 166, inciso VI, e 179, da Constituição do Estado de Minas Gerais.
Na oportunidade, REQUISITA:
a) Seja dada ciência imediata da presente recomendação a todos os vereadores da Câmara Municipal de Itaúna, com remessa ao MINISTÉRIO PÚBLICO de documento em que conste a ciência dos edis;
b) Sejam encaminhadas informações a esta Promotoria de Justiça, no prazo impreterível de 10 (dez) dias corridos, a contar do recebimento desta, acerca das providências adotadas em face desta recomendação ou das razões para o seu eventual não acatamento.
Itaúna, 19 de março de 2021.
Weber Augusto Rabelo Vasconcelos
Promotor de Justiça